4.1.14

My Favorite Demon XIII

Créditos da imagem à F.Y.S.M.
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O fim da marionetista


Nós humanos temos um defeito terrível: somos curiosos. Em nossa busca incansável pelo conhecimento acabamos descobrindo coisas que não queríamos descobrir, desenterrando o que não deveria ser desenterrado...
Somos criaturas desprezíveis, só esperando a doce visita da tão temida e aguardada morte. Mas... Seria ela tão ruim assim? Comparada aos humanos, cruéis humanos, a morte é apenas uma amiga que vem nos visitar quando não temos mais o que fazer nesse mundo. Nada mais que alguém que nos impede de perder tempo quando já cumprimos nossa missão…

— A verdade sempre nos surpreende não é, minha querida? — Marie sussurrou enquanto amarrava minhas mãos com uma fita — Mas, junto com a surpresa, ela nos traz uma dúvida: o que vamos fazer com o conhecimento recém-adquirido?

Senti Marie colocar algo em meus pés, parecia ser uma pantufa do mais fofo algodão de tão quente e confortável que era… Olhei para a esquerda e vi um par de luvas brancas iguais as do meu mordomo e logo olhei em volta procurando-o. Em vão.

— O-onde ele está? — Perguntei, a voz ainda falhando um pouco.

— Oh, minha querida... Mesmo depois de descobrir a verdade você continua a correr atrás do pecado? Ainda vai correr atrás daquele que te arrancou tão brutalmente da sua família? — Ela tocou minha face, os dedos frios escorregando em minha pele — Aceite a nova vida que estou lhe oferecendo. Me aceite.

Só quando tentei me soltar foi que percebi como aquela fita era forte, quanto mais força eu fazia, mais ela me apertava... Meus pés, presos em sabe-se lá o quê, também não se moviam... Ergui os olhos para Marie, que estava com o rosto a centímetros do meu e com um sorriso nos lábios que nem o próprio diabo seria capaz de exibir, seus dentes se tornavam pontudos ao mesmo tempo em que seus dedos ficavam cada vez mais frios.
Fechei os olhos.
Direcionei todos os meus pensamentos para Sebastian, chamei-o com todas as minhas forças enquanto rezava para um Deus que eu nem lembrava existir. Pouco me importava o quão hipócrita ou idiota estava sendo, mas quando estamos à beira do abismo nos agarramos a qualquer luz, mesmo que fraca, para nos salvar.

— Não feche seus olhos, minha querida. — Ela tocou meus olhos, apertei-os ainda mais forte me concentrando apenas em chamar Sebastian e orar da melhor forma que conseguia, mas eles se recusaram a continuar fechados — Quero que veja bem quando eu arrancar o seu coração impuro...

— O que diabos é você?! Por que está fazendo isso comigo?! — Berrei, encarando-a com ódio. Para meu azar, Marie tinha cansado de se fingir de boazinha. — Sebastian! Venha me salvar, agora!

Gritei o nome do meu mordomo o mais alto que pude e, nos segundos que se seguiram, fui invadida por uma esperança cega, que logo desapareceu ao ver o sorriso da mulher à minha frente.

— Aquele ser das trevas não vai mais te corromper minha querida... — Marie sussurrou com a voz suave enquanto se aproximava.

Ela puxou a parte de cima do meu vestido, arrebentando alguns botões e me permitindo ver parte de meus seios. Olhei para meu seio esquerdo, ao lado dele estava a marca do contrato com Sebastian, marca de sua lealdade. Mas... Tinha algo errado, correntes rubras se formavam lentamente em volta do delicado pentagrama...

— Vê? Não há nada mais que ele possa fazer. — Marie sorriu, como que esperando um agradecimento.

Continuei olhando para a marca, incrédula, enquanto tentava entender o que estava acontecendo. Sentia-me mais fraca a cada segundo, como se estivessem sugando minhas forças aos poucos...  Sentia-me vazia...
Ela... Ela estava tirando Sebastian de mim...
Paralisei por um segundo. Meu companheiro, meu fiel salvador, acabara de ser arrancado de mim. Estava a um passo do meu fim e sequer teria o prazer de ser morta por suas mãos suaves e frias, assim como não o alimentaria com meu corpo e alma...

— Vou te transformar em uma linda boneca... Uma linda e pura boneca... — Marie cantarolava enquanto mexia em algumas ferramentas sobre a mesa ao meu lado. — Uma boneca com lindas unhas...

Ela pegou minha mão direita, acariciando-a por um instante antes de finalmente escolher um dedo e segurá-lo com força. Arregalei os olhos enquanto tentava soltar minha mão e, ao mesmo tempo, ver o que ela estava planejando. Marie segurava firmemente um objeto de metal que eu nunca tinha visto na vida: era como uma pinça com uma lâmina que reluzia mesmo na fraca luz do ambiente de tão afiada. Ela aproximou-a do meu dedo e, no segundo seguinte, eu já estava gritando de dor.
Marie arrancara minha unha com força, sentia o sangue pingar em meu pé enquanto ela erguia a unha como se fosse um prêmio.

— Agora só faltam nove. — Ela riu, divertindo-se enquanto jogava a unha na mesa e escolhia o próximo dedo.

— Pare... Por favor... — Minha visão já estava turva por conta das lágrimas que não paravam de surgir. A dor me deixava tonta e o pavor já tinha tomado conta de mim. — Por favor...

— Não chore minha querida... O que está sentindo é a pureza tomando conta de seu corpo novamente... Isto é bom, muito bom! — Ela levou as mãos atrás da cabeça e começou a desamarrar a venda que cobrira seus olhos até agora. — Veja, eu também fui purificada anos atrás.

Assim que a venda caiu a seus pés, Marie ergueu o rosto para mim. O que vi era mais aterrorizante do que qualquer pesadelo que já tivesse tido ou ainda viria a ter nesta vida... No lugar de seus olhos, Marie tinha apenas dois buracos vazios, e olhar para eles era como olhar para um buraco negro que sugava minha alma com força e sem pudor.

— O QUE DIABOS É VOCÊ?! — Gritei apavorada enquanto tentava recuar, me afastar daquela criatura que continuava a me “encarar”, mas a parede atrás de mim não me ajudava nem um pouco.

— “O que diabos eu sou?” — Ela repetiu, rindo em seguida. Ela ia dizer algo quando parou e sorriu. — Parece que temos visita...

Acompanhei o olhar dela para o outro lado da sala, como que querendo que eu enxergasse melhor, a lua pareceu brilhar mais forte a partir daquele momento. Foi aí que eu o vi. Sebastian estava ali.
Seu uniforme estava rasgado e ele estava mais pálido que o normal, seus olhos que costumavam ser de um vermelho tão brilhante agora estavam opacos e fundos e fitavam Marie como um tigre faminto encara sua presa.

— Sebastian! — Gritei, um misto de surpresa e alívio. Mas ele me ignorou, só enxergava Marie. — Sebastian?

— Muito audacioso da sua parte aparecer na casa de uma marionetista... Ainda mais num estado tão deplorável. — Marie estava de frente para ele agora, de costas para mim.

Sebastian não disse uma palavra, seus lábios trincados não eram bom sinal...

— Luna, feche os olhos. — Sebastian praticamente rosnou sem tirar os olhos de Marie.

— Mas...

— Obedeça.

A voz de Sebastian era imperiosa, não ousei desobedecê-lo e fechei os olhos no mesmo segundo. No segundo seguinte, ouvi a voz de Marie; um grito agudo e apavorado preencheu a sala.
Mesmo sem estar vendo nada, soube naquele instante que era o fim da marionetista.

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